CAMINHOS INCERTOS, ALVOS INDEFINIDOS II
A DURA REALIDADE DO DEVER POLÍTICO DA IGREJA
1. A RESPONSABILIDADE
POLÍTICA DA IGREJA
“Não há, no pós-modernismo, um homem cônscio do seu dever moral, que seja apolítico ou integralmente laico; e por mais poder que o Estado tenha, é incapaz de tolher suas ações políticas e adorações secretas”.
A igreja tem sim responsabilidade política
e dela nunca deve se eximir. A teologia evangélica não se atém apenas a ensinar
e agir apontando unicamente para a vida do Reino
de Deus no Céu (transcendentalismo, vida eterna) e se esquiva do Reino de Deus na Terra (mundo presente,
visível), como se fosse possível dissociá-los. Temos compromisso primário com
Deus e isso jamais pode fugir de nosso entendimento, mas através da vontade d’Ele
e de seus mandamentos, temos também compromisso com o bem-estar do ser humano que
é Sua imagem e semelhança enquanto aqui estivermos. Diante dessa realidade,
nossas ações precisam se alinhar com a possibilidade de construirmos um mundo
melhor. Portanto, esperar que somente governantes cumpram seu papel com a
sociedade é omitir-se do dever cristão de amar o próximo como a si mesmo, e
amar o próximo tem a ver com amar a vida na pólis, com apresentar-se para
ocupar lugares e somar o máximo para que esse mundo melhor seja possível já nos
nossos dias. É bem verdade que a participação da religião na política e da
política na religião, tem se tornado tão natural no Brasil como o nascer e o
pôr-do-sol e, por mais que se tente impedi-la, ela se fortalece por si mesma,
tornando-se quase indissolúvel. E desde que isso se tornou comum a igreja
evangélica não retrocede, pelo contrário, avança cada vez mais nas questões
políticas, tornando-se voz conhecida e potente quanto à sua força nas cadeiras
parlamentares nos Estados, Cidades e no Congresso Nacional; bem como nos cargos
executivos (Prefeitos e Governadores) espalhados Brasil afora.
Todavia, a igreja não deve esquecer e nem
pode apagar da memória que a medida política correta justifica sua própria
finalidade e, um governante eficaz no sentido mais lato da política, quase
sempre utiliza todos os instrumentos do poder à sua disposição para unir
diversos interesses de classes aos interesses do Estado, dentre estas classes,
está incluída a classe evangélica. Ou seja, a imensa maioria dos políticos não cristãos
evangélicos vêem a igreja como um potencial gerador de votos e isso não é novo:
“A religião é vista pelas pessoas comuns
como verdadeira, pelos inteligentes como falsa, e pelos governantes como útil.”
Sêneca[1]. Na
mente e na linguagem do político astucioso isto está em voga, pois para ele o
senso comum é uma ferramenta indispensável para seu projeto de poder, ele não
tem nenhum compromisso, tampouco pudor com a ética da responsabilidade ou com a
moral, que são indiscutivelmente necessárias para uma política comprometida com
os valores cristãos. A igreja mesmo agindo civicamente no sentido de contribuir
para o bem da sociedade e fazendo algo que lhe é natural e corriqueiro,
respeitar as autoridades constituídas, deve repudiar e combater este tipo de
político, pois respeitar nada tem a ver com submeter-se a esse ou aquele
governante contribuindo para projetos de poder que assolam o povo, solapam os
cofres públicos e afrontam a família tradicional.
A igreja tem o dever de resistir a esta
filosofia inimiga do cristianismo e do povo em geral, a começar por combater e
desconstruir a retórica maquiavélica de que a ética cristã desequilibra o poder
do Estado. Tendo em vista ser a igreja a principal instituição que coopera para
o bem comum e a ordem na sociedade, é também seu papel eclesiástico pressionar
e se afastar de políticos que insistem neste modelo maligno. Por outro lado, é
preciso dizer que não se caracteriza como verdade absoluta a prerrogativa de
que o político chega ao poder por uma escolha determinada de Deus, nem sempre é
assim. Apesar de sermos cônscios em saber biblicamente que Deus intervém na
história. Mas se fosse sempre assim, não haveria razão de a igreja se empenhar em
apoiar candidatos com a esperança de que os mesmos defendam as pautas cristãs. No
meu simples modo de pensar, a igreja precisa amadurecer de forma célere nesse
sentido. Este argumento embora mediano, mas muito eficaz ainda em nossos dias, faz
que muitos se deitem em berço esplêndido achando que nada devem fazer para
mudar situações, enquanto isso o que há em curso é um movimento bem organizado
movido por grupos com interesses diversos em prol de sua investidura por vezes
não cristãos, e o candidato contemplado presta contas com estes grupos que o
alçou ao poder, sejam eles da esquerda, direita ou centro. Achar que política é
apenas a arte de governar bem, pode soar bastante romântico, porém fantasioso
do ponto de vista da realidade em que vive nossa nação (Os americanos do séc. XVIII não
pensavam assim quando lutaram pela sua liberdade), e ainda que se ignore
tal realidade, a democracia também se alimenta das lutas de classes. Logo,
organizar-se em grupos é de vital importância política para a disputa e a
manutenção do poder e do devido domínio, já que a igreja está se embrenhando
neste processo, ela deve estar preparada para grandes batalhas fora do campo da
fé. A questão é: “Vale a pena sair do itinerário divino e entrar nestas quizílias por qualquer
outra coisa senão a defesa do Evangelho de Jesus? E ainda, como a igreja agirá
para mergulhar na política partidária sem se afastar da missão tríplice dada
por Jesus a ela: Evangelização, Adoração, Edificação?” Estas perguntas
carecem de reflexões profundas antes de quaisquer decisões.
2. A REIVINDICAÇÃO DO GOVERNO À IGREJA, E DA IGREJA AO GOVERNO[2]
O subtítulo acima é de Dietrich
Bonhoeffer, pastor luterano alemão, membro da resistência alemã antinazista
contrária à política nazista de Hitler, que por essa causa, foi condenado e
morto por enforcamento em 1945 antes do término da segunda guerra mundial.
Sobre Estado e Igreja, Bonhoeffer entende que o conceito de Estado não é comum
no NT, para ele a palavra que soa comum no NT é autoridade. Bonhoeffer admite
que a política tenha uma técnica de administração e nela estão inseridas as
leis e os princípios morais da vida pública, o estadista que ignorar tais leis
e princípios pagará muito caro. Nesse conceito, o Estado é formado por governo
e governados sendo que, somente aos governantes pertence à autoridade. Esse
conceito de autoridade, porém, não pertence a uma forma ou um tipo determinado
de sociedade, pois a autoridade não nasce da sociedade, antes a organiza por
vir de Deus para exercer domínio na terra com autoridade divina.
Para Bonhoeffer, “a reivindicação de obediência e respeito por parte do governo, também
incluía a igreja e, em relação ao ministério espiritual, o governo só pode
exigir que a igreja não interfira no ministério secular, pois no exercício
pastoral o governo não tem poder ”[3]. Ele
acrescenta que uma das incumbências da igreja era exatamente a de admoestar as
autoridades para a obediência, e aqui talvez encontremos certo ponto nevrálgico
na igreja evangélica hodierna brasileira, ela faz isso muito bem no que se
refere a políticos que lhe causam aversão, mas se exime de cumprir esta
incumbência de forma repicada quanto aos candidatos que se elegeram com sua
anuência, talvez com receio de fazer uma autocrítica, talvez por estar
demasiadamente aliada ao candidato (a) eleito (a). O teólogo alemão ainda
afirma que é dever da igreja chamar os governantes à fé em Jesus, esse é o
ponto fundamental pelo qual eu alego de que se a igreja quer de fato fazer
política, ela deve fazê-la impregnada de seu dever maior que é o compromisso
com o Reino de Deus na Terra, com a prática da ética cristã, com os valores
fundamentais do cristianismo e, tendo como objetivo-Mor, NUNCA NEGOCIAR SEUS
PRINCÍPIOS ESTABELECIDOS PELA FÉ NO SEU CRISTO. Resta saber se a Comunidade
Evangélica Brasileira está disposta e pronta para cumprir esta multitarefa sem
se afastar da fé ortodoxa que exige santidade. Este é o grande desafio
da Igreja Evangélica Brasileira destes tempos. Que Deus nos ajude a cumprir nosso
papel.
Soli
Deo Glória
Pr. José Verneques Santos Presidente da AD-Ministério Paulista Primeiro Secretário da Comadespe
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