O DESAFIO DO OBREIRO SE MANTER FIEL AO CHAMADO DIANTE DAS MODERNIDADES DO SÉCULO XXI


 Pr. Marcos Cruz[1]

 

RESUMO

Os avanços tecnológicos ocorridos no Brasil têm gerado novas oportunidades de interação e possibilitou que a igreja evangélica se inserisse na rede mundial. Neste estudo propomos discorrer rapidamente sobre os cuidados que o obreiro precisa ter com sua vida, família e ministério e aprofundar a discussão sobre os desvios de foco evangelístico constatado em anúncios de pregações disponíveis no Youtube. Finalizamos com uma análise de conteúdo de materiais retirados de canais de pastores e igrejas no Youtube que buscam likes e compartilhamentos. Entre os objetivos estão: (i) revisar os cuidados que o obreiro deve ter com a família, ministério e vida pessoal.; (ii) contextualizar os valores assembleianos e o uso da tecnologia disponível a partir de 1980; (iii) analisar o objetivo proposto a partir de capas de vídeos de pregação disponíveis no Youtube. O que justifica essa escolha é o fato das inúmeras possibilidades que podem se tornar prioridade na vida dos obreiros impedindo-os de atingirem a evangelização proposta por Jesus Cristo. O arcabouço teórico que sustenta este trabalho são:  da história da Igreja Assembleia de Deus, Conde (2011), sobre ética ministerial de Carter e Trull (2010), da postura e vocação do obreiro, Piper (2009) e os e o comentário do Novo Testamento Moody (2010). A metodologia utilizada é revisão bibliográfica bibliográfica (GIL, 2003) e o método é a análise de conteúdo, da semiótica de linha francesa. Os resultados obtidos foram: (i) as mensagens transmitidas pela TV e no rádio nas décadas 1990/2000/2010 priorizavam mais a evangelização e a edificação da audiência, pois traziam marcas da instituição; (ii)  as transformações tecnológicas alteraram o conteúdo das mensagens veiculadas e (iii) no material analisado fois constado a captação de likes e engajamentos nas redes sócias e venda de método que propõe o crescimento de igrejas.

 

PALAVRAS-CHAVES: Obreiro fiel. Pregação midiátizada. Análise de Conteúdo. Prioridade do Obreiro. Obreiro e a tecnologia.


1 O OBREIRO E O CUIDADO COM A FAMÍLIA, MINISTÉRIO E VIDA PESSOAL.

Antes de nos aprofundarmos no tema que propomos discutir, precisamos definir dois termos- prioridade e fidelidade- que permeiam esse trabalho. De acordo com o dicionário Aurélio (2010), prioridade significa: “1- qualidade do que ou de quem é o primeiro; primado. 2- Precedência dada a alguém ou a algo”. Já o termo fidelidade, o mesmo dicionário a defino como “qualidade de fiel”.

Tradicionalmente, é reconhecido que, para o obreiro de Cristo, a família, a igreja e a vida social devem ser pensadas e mantidas como prioridade. Não pretendemos ir de encontro a esse pensamento, mas ao encontro dele e reafirmar que os cuidados com o ministério não podem, de forma alguma, ser dispensados. Por isso, o obreiro deve se abster de más companhias, deve fugir de escândalos sexuais e financeiros, além de não permitir que o relacionamento com o membro da igreja chegue ao ponto de impedir que ele seja aconselhado pelo grau de amizade que a relação alcançou. (CARTER; TRULL, 2010, p. 106.-139)

John Piper (2009) chama atenção para o modo em que o obreiro deve se manter na execução do ministério.  Para o autor, o obreiro precisa compreender que sua função não pode ser comparada a de um profissional devido a impossibilidade de profissionalizar o amor, a oração, o ministério, a visita ao membro da igreja, o relacionamento com Deus e tudo o mais.  Ele entende que a agenda de Deus é diferente da agenda do homem profissional e chama atenção para o fato de que os pastores são vocacionados por Deus e de que o relacionamento de Deus é baseado nas atividades mais próximas e humanas (PIPER, 2009, p. 17).

Nossa proposta aqui é não se prender a esses temas acima pelo fato de eles serem constantemente tratadas em reuniões de obreiros e escolas bíblicas.  Mas queremos abordar a competitividade geradas pelos avanços tecnológicos do século XXI, que, facilmente, podem colocar a instituição- igreja- e o obreiro no mundo globalizado, além de transformar as melhorias realizadas nas transmissões de cultos em diferenciais competitivos, além de inseri-los no círculo que passaremos a chamar de competitividade eclesiasticamente virtual.

2 OS VALORES ASSEMBLEIANOS E O USO DA TECNOLOGIA DISPONÍVEL A PARTIR DE 1980

Os meios de comunicação sempre foram usados para difusão da Palavra de Deus. Os missionários que implantaram o movimento pentecostal no Brasil usaram jornais, o rádio, a carta, a correspondência e a revista. Posteriormente, a partir da década de 1980, os pastores Silas Malafaia[2] e Carlos Apolinário inseriram programas a televisão. O pastor Silas iniciava seu programa com Coral e Orquestra Renascer[3], que era marca musical da Assembleia de Deus.  Carlos Apolinário, por sua vez, apresentava cantores solos e conjuntos[4].  Outro pastor que também usou a tecnologia naquela época foi Samuel Bezerra. Ele apresentou o programa Cristo em Casa[5] no rádio. Sua programação era composta de pregação e estudos da Palavra de Deus. Poderíamos citar outros, mas não temos esse objetivo aqui.

Nos anos 2000 novas tecnologias de comunicação surgiram. São ferramentas que viabilizam a pregação do evangelho com baixo custo. A partir da entrada do 4G, as transmissões e streaming se tornaram uma realidade. Uma pregação na televisão ou no rádio que, entre os anos de 1980 a 2010, custavam grandes somas de dinheiro, agora, por meio do streaming, se tornou possível a todos os obreiros e igrejas. E, muitos pastores, igrejas, institutos teológicos passaram a oferecer conteúdo aos internautas.

Se por um lado, a internet viabiliza a pregação, por outro, ela permite substituir a pregação evangelho por produtos que não objetivam levar o homem a Cristo. Além disso, a busca pelo sucesso das postagens tem levado muitos pregadores a lançarem mãos de métodos e técnicas que tornam as pregações em produções artísticas. São programas e recursos verbais que apresentam métodos para alcançar o crescimento da igreja e o sucesso na corrida por Likes, Views e compartilhamentos. Em alguns casos, pregações sensacionalistas, que nada anunciam, que vendem o ineditismo circulam entre os conteúdos mais visualizados no Youtube.

3 ANÁLISE DE CONTEÚDO DE CAPAS DE VÍDEOS DISPONÍVEIS NO YOUTUBE

Como parte do processo empírico, fizemos prints de capas de títulos de pregações disponíveis no Youtube para realizar uma breve análise de conteúdo, objetivando identificar o nível de manipulação contidas na estrutura verbal dos enunciados.  Lembramos que prints abaixo objetivam apena a análise de conteúdo não objetiva a exposição da pessoa.

Imagem 1[6]


Nesse anúncio percebemos o apelo ao raciocínio por meio do verbo “pensar”; em seguida à exclusividade “uma das pregações mais”. Logo após, o enunciado apela ao conteúdo alegando ser “Forte”. Percebemos o apelo ao tempo ao citar “nova” e ao aprofundamento do assunto ao citar que é “profunda”.  Ele descreve o gênero como “ensino”, apela à estética ao dizer que é “Linda” e ao alcance “que o mundo já ouviu”.

O modo do enunciado passa para o imperativo quando diz “ouça e seja abençoado” e, por fim, é apresentado o objetivo do texto ao dizer “clique em gostei e #compartilhe este vídeo”. No entanto, perguntamos: qual é a mensagem? Sobre quem ou o que ela fala? O que ela ensina? Sobre qual tema ela vai aprofundar?

Imagem 2[7]



Nesse texto, de início, encontramos seguinte enunciado: “Adoradores de Deus reunidos em um só lugar”.  Temos aqui a intertextualidade de atos 2, quando todos de uma só e única vez foram reunidos no mesmo lugar. Então perguntamos: seria uma reedição da igreja primitiva?  A internet será o novo cenáculo?  Lá foi o único lugar que a igreja conseguiu se reunir de uma só vez!  Em seguida encontramos as definições: “ A pregação que abalou o mundo” e manipulação da audiência pelo dever fazer “você precisa ouvir”.  No entanto pergunto: qual mundo foi abalado? Trata-se do mundo de 7 bilhões de pessoas?

A descrição aponta para um aprofundamento de conteúdo ao destacar: “mensagem profunda”; para a estética ao dizer que é a “mais Linda” e se refere ao alcance, quando diz “que o mundo já ouviu”. Igualmente ao texto do vídeo anterior, o modo usado passa a ser o imperativo ao dizer: “ouça e seja abençoado” e, por fim, revela o objetivo “clique em gostei, e #compartilhe este vídeo”.

 

Imagem 3 [8]


 

Nesse enunciado, o apelo ao ineditismo é claro ao destacar em caixa alta que o conteúdo é “INÉDITO”. Em seguida, propõe o extraordinário ao dizer que “O PAPA VAI RESSUSCITAR” e finaliza apelando para o efeito dizendo que é “IMPACTANTE”. Nela o internauta é motivado pelo ineditismo, pelo extraordinário e pelo efeito contido no verbal.

Imagem 4[9]



Por fim, em outro exemplo, constatamos a propostas de crescimento de igrejas e renovação do grupo de jovens proporcionados por programas e inovações tecnológicas. Geralmente esses eventos oferecem uma fórmula para o crescimento da igreja e atrelam à melhorias realizadas no sistema de comunicação da igreja. Essas propostas podem facilmente criar o sentido de que o crescimento da igreja é fruto do marketing ou de uma formula. Esses métodos vão de encontro com o que diz o texto “Deus é quem fez crescer” (1 Cor. 3.6).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse estudo apresentamos revisamos que a família, a vida pessoal e o ministério do obreiro não podem ser colocados de lado, antes, precisam ser tratados constantemente. Relembramos que a tecnologia foi um aliado na pregação do evangelho para os primeiros pastores e missionários que implantaram e desenvolveram o trabalho pentecostal no Brasil. Passamos também pela década 1980, quando os primeiros programas de pastores assembleianos foram ao ar por meio de canais de televisão, além de programas de rádio que tinha como objetivo ensinar o evangelho ou anunciar a salvação.  

Os programas apresentados na televisão brasileira traziam conteúdos destinados a promover a salvação e o crescimento espiritual. Eram apresentados corais, estudos, maratonas bíblicas, enfim, os valores defendidos pela igreja Assembleia de Deus. Constatamos nesse estudo que as novas tecnologias facilitaram a propagação da Palavra de Deus, mas verificamos nos conteúdos analisados e disponíveis nas redes sociais, especialmente, no Youtube nem mesmo apresentam o nome de Jesus em suas capas ou mesmo na descrição do vídeo, embora, em comum, todos buscam Likes, engajamento e compartilhamento.  Por fim, a tecnologia muda, mas o foco da mensagem não pode mudar.

 

REFERÊNCIAS

Bíblia Sagrada. Nova versão Internacional. São Paulo: Vida, 2000.

CONDE, Emílio. História das Assembleias de Deus no Brasil. Rio Janeiro: 2011.

CARTER, James E.;TRULL, Joe E. Ética Ministerial. São Paulo: Vida Nova, 2010.

HARRISON, Everett. Novo Comentário Bíblico Moody. V.2. São Paulo: Editora Batista Regular, 2010.

NEVES, Natalino das. O cuidado de Deus com o corpo de Cristo. Rio de Janeiro : CPAD, 2021.

PIPER, John. Irmãos, Nós Não Somos Profissionais. São Paulo: Shedd, 2009.

RIBEIRO, Ari Luís do Vale. Jesus e os Movimentos Messiânicos. 2 ed. Revista de Cultura teológica - v. 17 - n. 66 - Jan/MaR 2009

ZABATIERO, Júlio Paulo Tavares; LEONEL, João. Bíblia, Literatura e Linguagem. São Paulo: Paulus, 2011.

ZABATIERO, Júlio Paulo Tavares. Uma História Cultural de Israel. São Paulo: Paulus, 2013.

 



[1] Pastor na Assembleia de Deus Ministério de Interlagos- São Paulo-SP. Graduado em teologia pela Faculdade Fonte de Belém- FATESB; graduado em jornalismo pela Universidade Santo Amaro- UNISA e mestrando no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar da Universidade Santo Amaro- UNISA.

[3] Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=h43ujbV8qYI. Acesso em 20/jul/ 2021.

[4] Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JGGxlmjk5Qo. Acesso em 20/jul/ 2021.

[6] Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SD3_eeCYTQ4. Acesso em 20/ jul/ 2021

[7] Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=YJmi3acWsAI. Acesso em 20/jul/ 2021

[8] Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JnyT7Ui74Uc. Acesso em: 20/jul/ 2021

[9] Disponível em: (9) Watch | Facebook . Acesso em 20/jul/ 2021

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