Saindo de um perigo e entrando em outro

Saindo de um perigo e entrando em outro

Por José Verneques Santos

 

     O nascimento do pentecostalismo no Brasil no início do séc. XX se deu por duas denominações em sua ordem: Congregação Cristã no Brasil e Assembleia de Deus. A primeira fechou-se para a comunhão com as demais denominações e para o ensino metódico da Escritura Sagrada entendendo serem estas duas opções totalmente prejudiciais para a espiritualidade de seus fiéis. Desse modo, a CCB escolheu seguir pelo caminho do individualismo denominacional mantendo uma espécie de liturgia e pentecostalismo exclusivista.

     Já a segunda denominação, aprofundou-se na experiência pentecostal dando ênfase as manifestações dos dons espirituais espalhando-se pelo país e crescendo de forma assustadora e imprevisível. Esta investida foi acertada, pois a igreja estava sob a direção do Espírito Santo. Todavia, num país continental de cultura polivalente era impossível haver um controle sobre cada igreja local recém-aberta pela Assembleia de Deus no quesito da experiência pentecostal acerca dos dons espirituais, tendo em vista predominar na sociedade uma forte influência da cultura afro e do misticismo religioso dominante. Desse modo, os cultos pentecostais absorveram grande parte do misticismo de ambas as culturas, tornando-se parte da liturgia pentecostal e, consequentemente, um grande problema para o pentecostalismo autêntico. Com a perseverança da ED e a introdução do Curso Teológico nas ADs, aos poucos a importância do misticismo como algo imprescindível no culto, fora sendo superada pela Palavra de Deus. Nos 70 surgiram as igrejas neopentecostais e, com elas, o misticismo supersticioso e a cultura afro novamente afloram na igreja evangélica pentecostal, desta vez com a força hercúlea da mídia televisada.

     As ADs sofrem novamente o abalo no abuso dos dons espirituais por grande parte de seus fiéis desavisados e prejudicados por terem sido privados do ensino metódico da Escritura Sagrada através de cursos teológicos. No entanto, a igreja mãe do pentecostalismo se sobrepôs e manteve o equilíbrio do culto pentecostal clássico dando ênfase à manifestações dos dons espirituais e ao ensino da Palavra de Deus através das EDs e dos cursos teológicos espalhados nas grandes denominações Assembleianas. Este perigo fora definitivamente vencido, porém, outro perigo estava a caminho. Com a falência do misticismo em grande parte das ADs, (reconhece-se que ele ainda existe em algumas igrejas locais de periferias e zonas rurais), a igreja aprofundou-se na Palavra de Deus através das EDs, dos Simcecs, workshops, seminários, elads e dos cursos básico, médio e superior de teologia, enfim, a Assembleia de Deus finalmente tornou-se uma denominação reconhecida pelas grandes igrejas chamadas de tradicionais, reformadas ou históricas.

      A Assembleia de Deus, de maneira necessária e louvável se aproximou destas igrejas históricas e isso a fez crescer muito nos quesitos do sermão expositivo, do comprometimento com a obra missionária, da importância de sua participação na sociedade, política, etc., houve também uma aproximação natural da teologia de tais denominações de natureza Calvinista e Cessacionista. E é neste ponto que surge o próximo perigo, não menos nocivo que o já vencido misticismo, o problema é que esta aproximação levou a denominação pentecostal a flertar e enamorar-se com os principais expoentes da teologia calvinista/cessacionista. Tem sido comum em nossos dias as sementes do calvinismo/cessacionismo sendo disseminadas e bem aceitas diariamente através de postagens, frases e vídeos de pregações com viés de tal teologia no trigal do pentecostalismo. Com tal estratégia de adquirir cristãos pentecostais para o seu redil, as igrejas calvinistas/cessacionistas aos poucos têm conseguido arrastar milhares para suas denominações, não bastasse isto, a teologia pentecostal começa a ser questionada por grande parte dos fiéis que ficam e, ao mesmo tempo, desmotivada até por parte de líderes assembleianos que já não estimulam mais os seus membros a buscarem com zelo os dons espirituais, pois muito deles sequer os receberam.

     O resultado disso tem sido uma liturgia formalista e quase cética nas ADs atuais, hoje pouco se fala em dons espirituais e, na maioria das vezes, pastores que o fazem sequer tiveram a experiência pentecostal, não é mais motivo de espanto nos deparar com ministros assembleianos que ainda não foram batizados no Espírito Santo e foram consagrados ao ministério pastoral com o pleno conhecimento de seus líderes, com isso as ADs vai a cada dia se inserindo no mundo protestante tradicional e se afastando sorrateiramente da teologia pentecostal. A constatação de tudo isso que presenciamos é a de que saímos de um extremo (misticismo supersticioso) e, estamos entrando em outro (formalismo cético). Se nada for feito por parte da liderança pentecostal, não demorará muito para termos alguma convenção assembleiana de confissão calvinista/cessacionista. Já é sabido que temos uma porcentagem razoável de pastores assembleianos calvinistas, daí para os mesmos abraçarem o cessacionismo será apenas um processo natural. É somente uma questão de tempo e quem viver verá.

Pr. José Verneques Santos

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