Pr. Marcos Cruz[1]
A quarentena estabelecida no Brasil no início de 2020, que
objetivou a contenção da proliferação do novo coronavírus, obrigou as igrejas evangélicas
a transferir suas atividades presenciais realizadas no templo para o ambiente
virtual repentinamente. Apesar de os estudos sobre a conectividade em
rede mundial de computadores não ser novo, aliás, em 1999, Manuel Castells já
havia se debruçado em pesquisar esse movimento e escreveu que o momento em que
o mundo estaria conectado por meio de internet já estava em andamento, boa
parte das igrejas pentecostais brasileiras não estavam preparadas para esse fato
quando chegou a pandemia e, por isso, tiveram dificuldade na realização e
transmissão de seus eventos.
Com o agravamento da covid-19, os cultos públicos, as escolas
dominicais, as reuniões de oração e outros eventos fundamentais na difusão de
doutrinas pentecostais tiveram que ser
realizadas por videoconferências ou por meio de Lives nas redes sociais. E isso
expôs o (des)preparo tanto de algumas igrejas como de pastores, principalmente,
porque além de não terem sido treinados para falar diante das câmeras, o modelo
de interação com quem está assistindo a um culto por meio de streaming ou
participando de uma videoconferência foge do tradicional, percebido nos eventos
presenciais.
Além disso, o streaming exige o uso de uma linguagem que é diferente
da que normalmente é utilizada durante o culto realizado no templo. Soma-se a
isso, necessidade de investimentos em equipamentos de áudio e vídeo, que exige
grandes somas de dinheiro. Sobre isso, o teólogo, escritor e pastor Daladier Santos
apresenta 13 elementos que devem ser observados por aqueles que querem
desenvolver um ministério virtual. São eles:
Treinar essa equipe para que todos atuem de forma padronizada e deem respostas em sintonia com as diretrizes da liderança;
Adquirir os equipamentos mínimos para seu funcionamento: notebooks, mesa de som, câmeras de qualidade razoável, conexão de internet, entre outros hardwares e softwares minimamente indispensáveis;
Criar e manter uma home page da Igreja onde estará centralizado todo o conteúdo criado;
Manter atualizadas as informações referentes a datas, horários e locais de culto da(s) igreja(s) de determinado ministério, providenciando georeferenciamento das congregações [para grandes igrejas que possuem muitas filiais, identificadas entre os evangélicos como congregações];
Criar as contas nos mais diversos canais, se não existirem. Dispensável dizer que devem ser nomes fáceis de associar ao nome da Igreja;
Criar conteúdo relevante e diversificado, nas mais diferentes mídias: texto, vídeo, podcast, etc;
Criar os e-mails de acordo com um organograma pré-estabelecido, para os envolvidos em tal empreitada;
Organizar um esquema tático para implementar as ações que farão parte de sua atuação, definindo papeis bem específicos para cada componente;
Posicionar a liderança [da igreja] do andamento dos trabalhos, apresentando relatórios periódicos;
Administrar o impulsionamento das postagens, se for o caso. Montar os melhores públicos, dias e horários;
Reavaliar sua atuação periodicamente, para realizar suas atividades cada vez mais com qualidade e excelência (SANTOS, 2021).
Em seu post, Santos (2021) aborda sobre como deve se
proceder as igrejas que pretendem montar e manter um ministério que atue
constantemente no ambiente virtual. Se considerarmos que, nos últimos dois anos,
a igreja teve que adaptar suas atividades presenciais para o ambiente virtual,
pode-se dizer que a igreja brasileira teve que implantar um ministério virtual?
De todo modo, as dificuldades enfrentadas por pastores e
igrejas que investiram em transmissões virtuais são compreensíveis. Primeiro, a
adaptação ao novo modelo de comunicação não constava nos processos de formação
pastoral embora se percebe a presença cada vez maior de pastores nas
plataformas de streaming. E segundo, a resistência por parte daqueles que são
contrários a transmissão de pregação por streaming atinge tanto líderes quando
membros de igreja.
E mesmo assim, muitos pastores, durante a
quarentena, transmitiram seus cultos ou pregações usando apenas um dispositivo
de celular. Nelas, eles não fizeram enquadramento ideal, não usaram microfones
externos, iluminação e tampouco aplicaram os recursos técnicos, gratuitos, que
estão disponíveis na internet e que dão maior qualidade ao streaming. Por essa razão, propomos discutir sobre a
capacitação interdisciplinar que deve ser proposta aos novos pastores
pentecostais no Brasil, que atuarão no mundo pós-pandemia. Em caso de alguma
nova proposta nesse sentido, será uma quebra de paradigma?
Se por um lado, existe a consciência de que o agir de Deus
não está limitado à tecnologia, por outro, deve-se reconhecer que, no ambiente
virtual, para aonde o mundo se direciona, a qualidade técnica aplicada na
transmissão de um evento pode atrair ou dispersar a atenção de
internautas. E é nesse âmbito que a
disputa pela audiência durante as transmissões de cultos cresce ainda mais. E,
como boa parte dos pastores pentecostais estão desprovidos de recursos
tecnológicos para apresentar em seus eventos, pode-se imaginar que muitos
membros de determinadas igrejas se tornarão seguidores e consumidores de conteúdos produzidos por outros pastores e igrejas que oferecem maior qualidade
em suas transmissões, mesmo que tais conteúdos os distanciem do que é pregado
em sua igreja.
E por meio dessa oportunidade, se assim podemos dizer,
muitos pseudopastores se lançam nas plataformas digitais mais como meros
apresentadores, promotores de entretenimento e arrecadadores financeiros do que
como discipuladores do evangelho de Cristo. Diante disso, caberá aos
internautas – cristãos fieis e membros atuantes na igreja onde congregam- decidirem
se permanecerão assistindo ou interagindo com seus pastores ou igrejas por meio
da programação apresentada na rede ou se migram para outro streaming que
apresenta melhor qualidade na transmissão. Acrescenta-se a isso que esses
eventos podem estar sendo realizados por outras instituições evangélicas,
sérias, como institutos teológicos, ou por conferencistas renomados ou, então, por
cantores consagrados no meio evangélico.
De todo modo, como escreveu Castells (1999), a revolução
informacional não apenas reduziu os espaços entre povos, culturas, nações e
continentes, como também abriu oportunidades e ampliou a competitividade entre
todos os que se lançam no mundo virtual. Isto é, um culto bem organizado e transmitido
com boa qualidade técnica pode atrair fieis de qualquer parte do mundo,
independente do que está sendo pregado.
No século XXI, qualquer pessoa de posse de uma conexão banda
larga, de um dispositivo eletrônico e de algum atrativo pode se lançar no
cenário evangélico e disputar por maior audiência, seguidores e parceiros
financeiros. E nessa corrida devem ser inclusos aqueles que se denominam como a
continuidade ou até mesmo como uma nova versão de algum profeta do Antigo
Testamento e, por essa razão, se vestem caracterizados conforme as descrições
bíblicas. Sobre isso pretendemos discorrer no próximo estudo.
De toda forma, não afirmamos com isso que todos os pastores
e igrejas que transmitem cultos e eventos por meio do streaming têm o objetivo
de competir uns com os outros, e nem que os que transmitem fazem sem qualidade técnica,
antes, temos ciência de que um considerável número de igrejas passou a utilizar
esses recursos a fim de disponibilizar cultos, escolas bíblicas e outras
atividades nas plataformas digitais e que tais eventos apresentam valores
pedagógicos, espirituais e doutrinários relevantes e essenciais para o
crescimento e fortalecimento das bases doutrinárias na comunidade evangélica.
E, além disso,
estamos cientes de que, mesmo com toda a falta de recurso para investir em
tecnologia de transmissão, os evangélicos se beneficiam desses conteúdos
disponíveis na rede. Basta ver o número crescente de debates, simpósios,
entrevistas e diálogos entre escritores e teólogos pentecostais nas plataformas
digitais. Fato que indica um avanço dos pentecostais nesse sentido.
Entretanto, é bom que se reforce, que não propomos esgotar o
tema, mas prosseguir com o diálogo sobre a novas formas de como se preparar um
obreiro para executar o ministério pastoral considerando as novas
possibilidades proporcionadas pelos avanços tecnológicos do século XXI. Se por
um lado, sabemos que o conhecimento teológico, a oração, a dedicação, a
consagração e outras características são indispensáveis aos que pretendem seguir
a carreira pastoral como consta em 1Timóteo, 3,1-13, por outro, o uso das
tecnologias, de que modo lidar com a possibilidade do surgimento e/ou acirramento
da competição entre pastores e igrejas e os movimentos hereges provocado por
dissidentes do movimento pentecostal presentes no ambiente virtual devem
constar no programa de formação de novos obreiros.
Acrescentamos a essa discussão, a possibilidade do desvio de
foco. Uma vez que os meios de comunicação sempre foram utilizados pelos
pentecostais como meio de evangelização e discipulado, não visando promover a
popularidade do comunicador, mas sobre isso, pretendemos discorrer em trabalhos
futuros. De toda forma, há muito a que
se discutir sobre esse tema.
REFERENCIAS
BÍBLIA Sagrada. São
Paulo: Editora Vida, 2000. Nova Versão Internacional.
CASTELLS, Manuel. A
Sociedade em Rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999
SANTOS, Daladier. O que não é um ministério Digital?.
2021. Disponível em: O que não
é um Ministério Digital!? - Reflexões sobre quase tudo! (daladierlima.com).
Acesso em 12/ jul/2021.
SCHOKEL, Luís Alonso. Bíblia do Peregrino. 6 ed. São
Paulo: Paulus, 2006.
[1] Pastor na Assembleia de Deus Ministério de Interlagos- São Paulo-SP. Graduado em teologia pela Faculdade Fonte de Belém- FATESB; graduado em jornalismo pela Universidade Santo Amaro- UNISA e mestrando no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar da Universidade Santo Amaro- UNISA.
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